quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Tintim e o javali astronauta

Por incrível que pareça, algo com um título tão absurdo não foi um sonho! Era apenas a minha mente de criança a perceber que podia gozar com as personagens de banda desenhada se usasse o scanner! Era só digitalizar, apagar o que eles diziam e escrever outra coisa! E isso era bem divertido. Fiz isso com várias personagens de várias bandas desenhadas (Disney, Turma da Mônica...), mas as que fiz com o Tintim foram provavelmente as mais "tolas" de tão absurdas que eram. Quer dizer...nem todas eram tão ilógicas que não fizessem sentido nenhum, vá lá. Algumas eram simplesmente auto-críticas das personagens. E com "auto-críticas", quero dizer que os punha a dizer coisas como "Eu sou um macaco bêbado!" XDD! E isso era quando as personagens tinham sorte. Às vezes era outra personagem que as insultava - por vezes, até o próprio Tintim! Ele chegou a dizer: "Como vocês são E.T's parvos!". Dá para acreditar?! Mas enfim...a mais ilógica das coisas que os pus a dizer foi, provavelmente, o diálogo entre os dois bandidos do álbum "A Orelha Quebrada" (aka "O Ídolo Roubado").


"Gorrrdo cheio de sopa!" XD


Na "cena" em que esses bandidos, cujos nomes são Alonso e Ramon, vão no carro e um diz ao outro que ele visa demasiado à direita (o Ramon tem este problema ao longo do álbum, sendo que tenta acertar em pessoas e falha sempre) e este responde coisa como "Ora, nem tanto assim...", eu apaguei-lhes as falas e troquei-as por elementos completamente diferentes e pouco interligados. Sejamos mais específicos: eu fingi que eles estavam a ouvir rádio - no quadradinho em questão não vemos um rádio, mas eu fingi que o carro tinha rádio - e que o Alonso comemorava uma notícia. A comemoração dele era, salvo erro, assim: "Ena! Golo! O javali desistiu da ida à Lua! Os polícias vão ser poucos! Tiro-te o casaco!". Não me lembro do que fiz o Ramon responder, mas só esta fala já é de partir a rir!


- Ele está a gozar connosco!
- Cala-te, Alonso! Pareces o Banzai em O Rei Leão 3!


Reparem...numa só fala eu criei um mundo do absurdo onde:
1. Uma expressão comemorativa de futebol ("Golo!") é usada para comemorar qualquer coisa;
2. Os javalis podem ir à Lua (!);
3. Os javalis podem desistir de ir à Lua se isso lhes der na cabeça;
4. A desistência de um javali em viajar no espaço, vá-se lá saber porquê, reduz o número de polícias nas ruas;
5. A expressão "Tiro-te o chapéu" mudou por completo, para uma frase que congratula alguém pelo que essa pessoa não fez (!) e em que se trocou o chapéu pelo casaco!
Mais absurdo é difícil!

Suponho que não é preciso levar a imaginação tão longe para fazer Teatro do Absurdo, mas para efeitos de humor este sistema da imaginação de criança funciona bem. Como bónus, ficam já a saber que no mundo absurdo do Tintim que eu criei com o scanner, além de os crocodilos guardarem armazéns, não se toca à campainha: toca-se o elefante. Ou seja, há um pequeno buraco na parede de onde sai uma enorme tromba de elefante e tem de se puxar a tromba para produzir o som que corresponde ao tocar de uma campainha. Campainha essa que, note-se, soa como um elefante furioso!

sábado, 3 de agosto de 2013

Bugs Bunny, pirata e...capitão?

Esta foi uma brincadeira de um só dia, porque nós não tínhamos um estádio à nossa disposição para brincar a isto quando quiséssemos. Foi uma brincadeira que inventámos na altura, inspirada num momento de um episódio de Bugs Bunny. Era um momento engraçado em que Bugs se escondia num navio pirata comandado pelo bom e velho Yosemite Sam. E o Sam procurava-o, com resultados bem divertidos. Ora, aconteceu que um certo dia fomos ver um primo meu jogar a um pequeno estádio. Pequeno ou não, o lugar tinha muitas cadeiras e nós éramos pequenos, o que nos permitia esconder atrás de muitas delas enquanto o nosso primo nos procurava. O que eu, uma prima minha e o tal primo jogámos juntos foi uma espécie de jogo das escondidas. Uma espécie, mesmo, porque não havia aquela coisa do "um dois três casquinhas (inserir nome) livra tudo" nem aquilo de o "procurador" nos procurar até nos encontrar ou desistir. Não; nós preferimos fazer o nosso primo rir chamando-o quando ele estava longe de nós! A ideia era mesmo imitar o Bugs Bunny a chamar o Sam, sabendo que este não o podia apanhar. Então, o nosso primo procurava-nos e nós saíamos, por vezes, de detrás da cadeira a imitar o Bugs Bunny.


Já sabemos que não há muitas versões dobradas em português no Youtube...
Aqui está a versão original da cena, logo no início.


Claro que o que dava mais gozo na brincadeira era ser o mais Bugs Bunny possível. Portanto, eu e a minha prima escondíamo-nos como o coelho, imitávamos os gestos dele e, acima de tudo, imitávamos as palavras dele na dobragem portuguesa. Ou seja: o plano era eu e a minha prima (o meu primo não conhecia as falas) dizermos as falas de Bugs um de cada vez. As falas eram apenas duas: "Iuhu, senhor pirata!" e "Ó barba ruiva!", e era isso que eu dizia quando me calhava uma delas. A parte engraçadinha começava depois: a minha prima dizia bem o "Iuhu, senhor pirata!", mas não se lembrava ao certo da fala seguinte. Só sabia que tinha a ver com piratas. Então, quando era a vez de ela dizer "Ó barba ruiva!", ela não sabia a fala mas sabia que tinha de dizer alguma coisa. Assim sendo, eu acho que o cérebro dela fazia a associação entre palavras relacionadas com o mar e a levava a dizer algo parecido. E a associação era divertida! Em vez de ela dizer: "Ó barba ruiva!", dizia antes...conseguem adivinhar? Adivinham?
Não conseguem adivinhar? Ok...bem, ela dizia: "Ó capitão!" XDDD. É, acho graça a esta associação de ideias. De barba ruiva para capitão...hehe! E talvez isso se devesse também ao facto de ela conhecer o capitão Haddock, da banda-desenhada Tintim...

terça-feira, 30 de julho de 2013

Para os interessados...(contacto)

Caros leitores deste blog:

Há quem diga que não é exactamente bonito aprender com os erros dos outros em vez de com os nossos - supostamente, assim parece que no estamos a aproveitar da desgraça alheia - mas foi o que realmente me aconteceu há pouco tempo. Um bocado por coincidência, visitei um blog que não conhecia e que falava de um assunto que me interessa muito - a dobragem em Portugal. Não os filmes ou os desenhos animados; a dobragem em si. A autora do blog surpreendeu-me pela positiva devido à familiaridade com que falava de alguns dobradores (sim, parece que essa palavra existe mesmo), ao facto de ela partilhar várias memórias e opiniões da minha infância e ao seu senso crítico. Porém, quando quis elogiar o seu blog (que parece estar abandonado há coisa de um ano), percebi que não conseguia encontrar o e-mail dela. Podia sempre comentar no blog, mas comentar um blog abandonado não deve fazer passar a mensagem. Por isso, pensei...será que o meu blog tem o mesmo problema? Não posso garantir que assim seja, pois não sou especialista em computadores. Mas, por via das dúvidas, quis corrigir este eventual erro. Não sei se conseguem ver o meu e-mail no meu perfil, por isso deixo-o aqui:

O meu e-mail é emailespecialdecorrida@gmail.com. Sintam-se à vontade para me dizerem o que quiserem sobre o blog. Bom dia para todos.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

A Rua Sésamo encontra os Power Rangers

Este foi um dos sonhos mais radicais que o meu cérebro me proporcionou! Foi basicamente a mistura de figuras feiosas e de marionetas bonitas, juntando-as numa luta sem tréguas! Nem sei por onde começar...bem, lembro-me que a Rua Sésamo foi invadida por três feiosos que tinham um poder destrutivo enorme, mas que começaram por fazer "apenas" bullying. Andavam pela rua a chatear as pessoas e a armar-se em bons, os sacanas! E quem eram este três feiosos? Bem, vejamos...um era um gordo que era uma mistura de Golem (o pokemon) com Dr. X (o arqui-inimigo do Action Man). O segundo era claramente baseado numa cobra-capelo que eu tinha visto num desenho animado (acho que era uma adaptação de O Rei Leão), só que em vez de encostar o corpo ao chão, a "cobra" tinha pernas com garras afiadas e um rabo muito parecido com o do Scorpion (um inimigo do Homem-Aranha). O terceiro era relativamente mais simples: uma espécie de tipo esfarrapado, sujo e loiro, muito malcriado e com uma voz horrorosa. Tão horrosa que soltava raios pela boca, vejam só!


Estão a ver uma mistura destes dois cromos?
O primeiro vilão!


Com tantos vilões, tinha de haver uns heróis para salvar a rua, não é? Pois o meu cérebro pensou isso mesmo: trouxe logo três heróis para combater aqueles vilões inacreditáveis. Mas os meus heróis eram deveras esquisitos! Um era ninguém menos que o Poupas Amarelo (com um ou dois dispositivos metálicos no seu corpo). Outro era o Ferrão - sim, o Ferrão! - só que, no lugar de cabeça de Ferrão, ele tinha uma cabeça que parecia a de um búfalo! E era assustador, tinha mesmo ar perigoso! Livrem-se de alguma vez se zangar com aquele Ferrão! Enfim...para terminar, havia o herói António (o corpo do actor Ricardo Monteiro vestido como se fosse um príncipe de feira medieval ou assim) com a sua guitarra! E o confronto entre eles tinha graça, além de uma ligeira (?) falta de lógica. Era uma coisa assim: os vilões armavam-se em maus e apareciam os heróis armados...bem, em heróis! Ambos os grupos estavam com uma grande bazófia! Os vilões metiam-se com os heróis e o António, sem medo nenhum, virava-se para o Ferrão e dizia-lhe assim: "Ó Ferrão, desculpa lá...acaba com eles!" O Ferrão assentia e virava-se para os vilões, gritando ao "Scorpion": "Não deves assustar as pessoas assim! Hã?!". Era assustador, hehe...quando o Ferrão terminava o que dizia com um "hã?", costumava estar zangado. Muito zangado!


Imaginem um herói que é uma mistura destes dois...parece assustador, não?


Quando os heróis se chateavam a valer com os vilões e vice-versa, havia bulha, pois então! Seguiram-se alguns confrontos entre heróis e vilões. Alguns deles tinham muito de confronto de Power Rangers! Em quê? Por exemplo...na primeira batalha, o Poupas e o "Golem" ficavam do tamanho de gigantes, daqueles que destroem cidades enquanto lutam! Tal como os inimigos do Power Rangers quando ficavam danados. Era então que os Rangers chamavam o seu Mega Navegador para um duelo de gigantes. E, tal como quando o Rangers enfrentaram os perigosos Psico Rangers, cada um enfrentava um. Ou seja: o Poupas enfrentava o Golem, o Ferrão o Scorpion e o António enfrentava o da voz horrível. Mas o mais hilariante era a luta entre o Ferrão e o Scorpion! Vejam bem: eles começavam a lutar na rua em que eu morava, mesmo no meio da estrada. E além de não passar nenhum carro, eles lutavam de maneira pouco dolorosa; não havia murros na cara (na barriga ainda havia...), nem pontapés, nem joelhadas, nem mordidelas! E entretanto o Scorpion tentava acertar com a sua verde cauda no Ferrão. Quando finalmente conseguiu acertar-lhe com a cauda, o que é que aconteceu ao Ferrão? Transformou-se em tapete! E ficou um tapete com olhos na estrada da minha rua!




Felizmente, no fim de contas, os heróis davam a volta à situação e venciam os vilões. Foi um dos meus poucos sonhos que acabou com um cliché.

segunda-feira, 1 de julho de 2013

A árvore dos titãs

Uma simples mas enorme árvore era uma das vítimas das nossas brincadeiras de criança. E digo "vítima" porque ela era mesmo uma vítima; tinha de levar com pedras e paus! Tudo isto porque o nosso jogo que não tinha nome (mais tarde, dei-lhe o nome "A árvore dos titãs") consistia em imaginar que os famosos titãs estavam escondidos na árvore e...atacá-los! E, em tom de brincadeira, era como na Idade Média; apedrejar e dar paulada! Só não tínhamos forquilhas, hehe...mas quem eram este titãs? Eram ninguém mais, ninguém menos do que os famosos titãs do filme "Hércules", da Disney! Já se sabe como é: as referências da pequenada, na sua maioria, eram televisivas!

Reconhecem-nos? Pois é; estes eram os nossos inimigos!


Nós tratávamos esses titãs por "diféres", porque lembrávamo-nos de quando o Hermes do filme dizia "Os titãs escaparam e estão quase a chegar ao portão!!!". E nós não percebíamos a palavra "titãs". O grande Carlos Freixo fez um bom trabalho como Hermes, é certo, mas os nossos ouvidos de criança não ouviam "titãs"; ouviam "diféres". E nós tentávamos derrotá-los atirando-lhes pedras e paus. E o "difér" mais difícil de todos era o difér tornado. Porquê? Porque, na nossa brincadeira, diferentes diféres estavam supostamente escondidos em diferentes partes da árvore. Logo por azar, o tornado estava na parte mais alta daquela árvore enorme! E nós, pequeninos que éramos, tínhamos de dar cabo do braço para conseguir acertar com uma pedra na parte de cima da árvore! Pois é...o difér de pedra era canja (escondia-se na parte mais baixa da árvore), mas o de lava e o tornado eram mesmo difíceis de agredir...

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Pi, a hiena e a Atlântida

Esta é uma das poucas brincadeiras que aqui vou postar que aconteceu mais recentemente. Há coisa de uns meses, tive a oportunidade de brincar com uma criança de cerca de 7 anos. Ela sabia que eu tinha visto o filme "A Vida de Pi", por isso perguntou-me se eu lhe podia emprestar os meus brinquedos de animais para brincarmos ao filme "A Vida de Pi". Com efeito, no tempo das vacas gordas, eu tinha comprado vários packs de bonecos de animais. E guardei-os. Tenho dezenas de insectos, vários tubarões, morsas, rinocerontes, morcegos, cobras...tantos! E quando vi que a criança tinha um boneco de um homem com a pele mais escura e o cabelo comprido, percebi que já tínhamos um boneco para fazer de Piscine - o verdadeiro nome de Pi. Lembram-se do filme? Só nos faltava o meu gorila (para ser o orangotango), a minha zebra, o meu tigre e a hiena de brincar que a criança tinha. Quando trouxe, então, os meus animais, estava tudo pronto para reproduzirmos "A Vida de Pi"! Usámos um tupperware como barco e pusemos os bonecos no tupperware. Eu só me tinha esquecido de uma coisa: que estava a brincar com uma criança com uma grande imaginação!


Um dos vários trailers de "A Vida de Pi".
Para, para, paradise...


De facto, ela tinha-me pedido para eu imitar ali "A Vida de Pi", mas suponho que ver tantos bonecos de animais lhe despertou a criatividade. Resultado? Bem, primeiro ela quis pôr os bonecos todos no "barco". Eu disse: "Mas n' A Vida de Pi eram só a hiena, o orangotango, a zebra e o tigre!" Mas ela não fez caso; preferiu brincar com todos! Lá continuámos a brincadeira...com dificuldade. O momento mais engraçado da brincadeira foi quando eu tentei pôr a hiena a fazer o que tinha de fazer (atacar a zebra, por exemplo), a criança decidiu mudar a história outra vez! Pegou na hiena, disse que ela fugiu para o mar (que era o chão) e pô-la a mergulhar no mar! Eu disse: "Eh lá, essa hiena ainda fica sem ar!" e ela respondeu: "Mas ela tem um fato de mergulhador!". Engraçado, não é? Mas não se ficou por aí; a criança levou a hiena tão para o "fundo do mar" (ou seja, andou com ela tanto no chão) que, segundo a sua narração, chegou a um lugar onde descobriu...a cidade perdida da Atlântida!!!


Eu? Descobrir a Atlântida?! HAHAHA!


Já não me lembro bem de como a brincadeira acabou (acho que a hiena, com o fato de mergulhador que a criança lhe tinha inventado, convidou os restantes animais a virem para a Atlântida), mas o facto de partirmos de uma premissa tão fechada como um argumento já escrito - o de "A Vida de Pi" - e depois trollarmos tanto a partir daí fez desta uma das brincadeiras mais absurdas que já brinquei!

terça-feira, 25 de junho de 2013

Bom tempo, mau tempo, bom tempo...

Esta brincadeira era tão simples que até custa a crer que nos divertíssemos a brincá-la. Mas, de facto, era assim. Durava, no máximo, um minuto. Era basicamente assim: uma ou mais pessoas posicionavam-se debaixo de um dos cobertos do recreio e esperavam o momento certo para sair de lá. Quando saíam, fingiam brincar; cantavam, saltavam, dançavam e por aí adiante. De repente, uma das pessoas (geralmente, era um rapaz) imitava o som de um trovão e todos fingiam assustar-se: a ideia era que ia chover! Então, todos os jogadores fugiam para debaixo do coberto e esperavam que a "chuva" passasse. E quando a chuva passava? Faziam tudo outra vez! Outra vez brincar lá fora, outra vez imitar um trovão, outra vez fugir para não apanhar "chuva", outra vez voltar quando a chuva parava! E isto podia durar uma meia hora! Coitadas das funcionárias; suponho que era um bocado chato estar a ouvir-nos fazer sempre-a-mesma-coisa, sempre-a-mesma-coisa...

terça-feira, 11 de junho de 2013

"Bóia bóia binha"

Por muitas cantigas de roda engraçadinhas que existissem durante a minha infância, a favorita de todo um grupo de pessoas que incluía a minha vizinha era o terno "Bóia bóia binha". Esta era copiada, quase ipsis verbis, de um sketche da boa e velha Rua Sésamo. Nesse sketche (que lamento não vos poder mostrar; não encontrei imagens nem vídeos dele), um grupo de personagens coloridas criadas num lindo 2D dava as mãos e andava à roda, cantando uma música muito engraçada. Essa música começava com o que nós ouvíamos como sendo "Bóia bóia binha". Em retrospectiva e após a revisão desse épico sketche, creio que afinal o que eles cantavam era "Bóia boiazinha". Mas nunca se sabe, não é? Bem...a música era mais ou menos assim: "Bóia boiazinha / Que faz assim, assim / Ora agora o [...] / Que faz assim, assim". No lugar do "[...]", ouvia-se uma profissão. As profissões eram costureira, sapateiro, brunideira e maestro. E de cada vez que cantavam uma profissão, as personagens imitavam-na com gestos! Exemplos: imitavam o sapateiro batendo na sola de um sapato e a brunideira esticando a roupa, passando-lhe a mão e tentando alisá-la. Esta cantiga de roda, se me permitem a expressão, era uma fofura.



Desenho tosco de uma das meninas da roda "Bóia bóia binha".
Sim, ela usava óculos escuros...


Nós, como crianças "imitadoras" que éramos, preferíamos a cantiga de roda "Bóia bóia binha" (juro-vos que nos soava assim!) a todas as outras quando nos queríamos divertir. É, por muito programa de televisão que fosse, a Rua Sésamo também nos sabia pôr a mexer; afinal, quem não se lembra do "Vai ginasticar"? Uma delícia. Mas já me estou a perder...adiante. Nós reuníamo-nos, então, dávamos as mãos e cantávamos "Bóia bóia binha / Que faz assim, assim / Ora agora o [...] / Que faz assim, assim". E gostávamos de imitar as profissões. Mas...mas...a nossa parte favorita da brincadeira nem era essa! A nossa parte favorita era imitar a parte só instrumental da música. Como estou a escrever, é impossível descrever essa parte instrumental, mas digamos que era uma espécie de "tum-DE-dum". E porque é que gostávamos de imitar essa parte? Porque era a parte em que as personagens paravam de rodar, apertavam mais as mãos e saltavam todos juntos! E saltar enquanto imitávamos o instrumental era uma delícia. Portanto, lá passávamos uma boa tarde a cantar "Bóia bóia binha" e a rir enquanto saltávamos e nos armávamos em instrumentos.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

A Bruxa que cantava "Lhulhu"

Este era um dos jogos mais teatrais que eu jogava (sim, era mais eu). Eu tinha uma colega que gostava de me ver a jogar porque se ria muito ao ver a minha figura. O que eu fazia era, basicamente, imitar uma bruxa que tinha visto na televisão. Essa bruxa metia coisas no seu caldeirão de bruxa enquanto cantarolava o que lá punha. Mais tarde, o Bugs Bunny aparecia - aquela cena fazia parte de um episódio do Bugs Bunny, mas isso é outra história. Então, eu imitava a bruxa. Como não havia muitos elementos esquisitos no recreio, o máximo que uma pessoa podia fazer para imitar uma bruxa era pegar em areia e fingir que era uma poção e em folhas e fingir que eram plantas especiais de corrida. Era o que eu fazia. Arranjava folhas, areia e um espacinho para ser o meu caldeirão. E punha-me a imitar a bruxa. Ora, acontece que a bruxa cantarolava em inglês! E eu não percebia patavina do que ela dizia. Só percebia o que ouvia. O que ela cantarolava era: "A cup of arsenic, a spider, some glue..." e por aí adiante. Claro que eu não percebia nada disso; na parte da "glue" (cola) é que eu ouvia "lhulhu". E era isso que eu cantava: lhulhu!


Mais uma vez, a versão original da cena.
A cantoria dela começa sensivelmente aos 0:47.


Então, como eu não percebia nada e só achava que percebia o "lhulhu", eu cantava uma coisa como "Ada Padapa Lhulhu". Parece mesmo estranho, não é? Ali ficava eu, durante um bom tempo, a pousar umas folhas, a deitar areia em cima delas e a cantar "Ada Padapa Lhulhu". E tanto eu como a minha colega nos começávamos a rir na mesma parte. A parte do "lhulhu", pois então! Era uma palavra muito engraçada. Tanto, que inicialmente eu jogava isto sozinho, mas quando a minha colega me ouviu a cantar, riu-se e perguntou-me o que eu estava a fazer. Expliquei-lhe e repeti a imitação da bruxa. Ela voltou a rir-se e eu ri também. Mas ela só me imitou, acho, uma vez. Das outras vezes, preferiu ver-me a imitar a bruxa. E eu imitava-a vezes sem conta e ambos ríamos vezes sem conta quando eu cantava "lhulhu".

Foca, mostrengos e o parque inundado

Por incrível que pareça (não há nada que não nos aconteça...:D), estas 3 coisas fazem todas parte da mesma coisa: um sonho! Um sonho de criança que eu tive. De todos os sonhos que eu tive, este provavelmente foi o mais absurdo de sempre. Sem exageros. A começar pelo seguinte: no sonho, eu não era bem eu; era uma foca do Lago Baical! Já sonharam que eram animais? Pois eu sonhei não só que era uma foca, mas uma foca do Lago Baical! As coisas que o meu cérebro ia buscar...eu tinha visto uma dessas focas algumas vezes num livro com imagens de animais. E, vá-se lá saber porquê, sonhei que era uma. Mas não fica por aí; vejam lá, a foca do Lago Baical que era eu estava numa sala estranha. Não era quadrada nem rectangular, mas em forma de trapézio. E qual não é o meu espanto quando aparecem 3 ou 4 mostrengos verdes com mocas que parece que me querem fazer mal!


Sonhei que era uma destas focas. Dá para acreditar?


Eu, como foca, começo a arrastar-me pelo chão em direcção à única saída da sala sem porta: 4 quadrados de cores diferentes. Todos os quadrados têm cores diferentes e todos parecem conter líquido (foca-líquido, estão a ver?). Mas durante os 2 segundos que eu tive para pensar para qual saltava, pensei. Um era vermelho...podia ser lava! Foge! Outros dois estavam ou todos verdes ou em parte verdes; pareciam estar cheios daquelas plantas aquáticas viscosas! Então, saltei para o único que era diferente: um azul-escuro que parecia ter muita água lá dentro. Mas não foi um salto simples: o meu cérebro congelou a imagem da foca do livro que eu tinha visto e fê-la dar um grande salto com cambalhota para trás e cair na água completamente estática! Eu pensava que me tinha livrado dos mostrengos, mas cair à água só me levou para uma espécie de jogo em que eu era  novamente eu. E tinha de ir buscar a minha mãe a um terreno inclinado que ficava ao pé de um parque infantil. Fácil? Nem pensem! Acontece que, quando eu punha um pé nesse terreno inclinado, havia uma inversão de gravidade fortíssima que me atirava ao chão com toda a força! Eu percebi logo que aquilo podia demorar um bocado...

Quando finalmente acabei o tal "jogo", o meu cérebro decidiu repetir-se! Voltou a pôr-me na pele da foca do Lago Baical e os mostrengos a perseguir-me. E eu a fugir, e a saltar para o mesmo quadrado. Aquilo já começava a ter algumas semelhanças com algumas peças de Eugène Ionesco: situações absurdas e hilariantes e...repetição. Sim, algumas peças repetiam falas já proferidas ou situações já passadas. Mas vamos em frente...quando saltei outra vez para o tal quadrado, fui para uma espécie de nível 2 do jogo do parque infantil. Só que este era muito mais sinistro! O parque estava a ser castigado por um tremendo dilúvio e estava tudo inundado! Só a minha mãe, lá em cima do terreno inclinado, se mantinha em terra firme. E eu só tinha um escadote para me manter à superfície. Não sei se os escadotes flutuam, mas enfim; era um sonho! Aquilo já era absurdo - e difícil - que chegue, e eis que aquele que parecia ser um amigo da escola primária aparece no escadote. E ficámos os dois a atropelar-nos na tentativa de não cairmos à agua. É que só uma pequena parte do escadote estava acima do nível da água. Tive até impressão que me empurrou para baixo e ainda caí à agua, apesar de me ter conseguido agarrar ao escadote...


Mal comparado...foi mais ou menos com esta situação que eu me deparei.


Não sei se o sonho terminou precisamente aí, mas creio que não voltei a ser foca nem a ter de jogar um jogo perigoso. De qualquer maneira, o sonho foi inesquecível de tão maluco que foi! Na altura, eu dava nomes aos meus sonhos. Quando acordei, resolvi chamar a este "Sonho Bué'd Estranho". Pudera...

sábado, 1 de junho de 2013

Pintainhos e o mapa de instruções

O meu cérebro sonhador (ainda hoje tenho muitos sonhos lúcidos e de que me lembro bem quando acordo; posso dizer que me divirto quando estou a dormir!) trouxe-me, em criança, um dos sonhos mais engraçados, inocentes e sem lógica que já tive. Ele era todo muito simples: basicamente, aparecia lá o sr. Almiro da Rua Sésamo com uma espécie de galinha de estimação. Esta galinha tinha pintainhos e falava, vejam só! E o meu cérebro não fez a coisa por menos: o que eu "vi" no sonho foi realmente a imagem do sr. Almiro que o actor António Anjos, paz à sua alma, nos trouxe. E com a voz dele! O meu cérebro reproduziu a voz dele muito bem; ouvia claramente o seu timbre a dizer palavras que eu nunca lhe tinha ouvido a dizer. E a galinha tinha uma voz mais abonecada, típica das galinhas dos desenhos animados.


Vêem o senhor com ar simpático à esquerda do Poupas (o pássaro alto)?
O sr. Almiro!


Mas ainda não cheguei à parte mais engraçada. Ora, o sr. Almiro, pelos vistos, estava a pedir aos seus animais de estimação para procurarem certas letras em grandes papéis com palavras. Eles acabavam de descobri-las e ele dizia algo do género: "Muito bem! Então agora procurem a letra...A!". A galinha entrava em alvoroço e apressava-se a procurar num papel grande, dizendo: "A letra A...". Depois de procurar um pouco, a galinha virava-se para trás e perguntava aos pintainhos, que olhavam para outro papel enorme: "Que é que vêem aí, meus queridos?". Eles respondiam com uma espécie de "piu-piu" difícil de compreender. O sr. Almiro vinha então perguntar-lhes o que eles tinham visto e, finalmente, via-se o papel visto de cima. Os pintainhos estavam a olhar para um desenho muito bem feito de...patos! Patos amarelos num lago! E o lago via-se bem. Mas os pintainhos, pelos vistos, queriam dizer que estavam a ver pintainhos! Como podiam eles ver pintainhos num desenho de patos?! Vá-se lá perceber estes sonhos malucos...enfim. Os pintainhos respondiam ao sr. Almiro ("piu-piu") e ele percebia a resposta deles: que estavam a ver pintainhos no desenho.

AGORA!
OUÇAM ESTA QUE É MUITO BOA:

Numa lógica hilariante comum nos sonhos, o sr. Almiro dizia o seguinte: "Ah, estão a ver aí pintainhos? Então eu vou ler o mapa de instruções!"


XDDDDDD!


Como se isto já não tivesse piada que chegue, o meu cérebro ainda fez o pobre sr. Almiro escorregar numa casca de banana assim que disse isto! E ele desequilibrava-se e caía numa posição quase estática, com as mãos viradas para cima. E caía em cima de três livros grandes! Sabem, aqueles livros mais altos que uma criança e de que as crianças geralmente gostavam por serem tão grandes. Ainda cheguei a ter uns livros desses, com títulos como "O Grande Livro dos Dinossauros". Só um exemplo. Mas enfim...o sr. Almiro caía em cima deles e soltava um hilariante "Au!". Mas recuperou depressa; pegou em cada um dos livros de cada vez e de cada vez que pegava num, dizia: "Este é o mapa de instruções? Não!". E de cada vez que dizia "Não!", atirava o livro para o lado, que caía com um som estrondoso! Já agora...porque é que um livro grande seria um mapa de instruções? E o que é um mapa de instruções? Conheço folhetos com instruções e papéis com instruções...mas mapas?

Ainda me rio muito quando recordo este sonho. Em especial, a frase do sr. Almiro sobre o mapa...

Está a ver ali aquela portinha?!

Muitos de nós viam o programa Batatoon. A bem dizer, alguns de nós só queriam saber dos desenhos animados. Não obstante, o programa ainda trouxe vários momentos divertidos à nossa infância. Um deles era a cena clássica do programa. Suponho que quem viu sabe do que eu estou a falar: o palhaço Companhia costumava vir, nas suas palavras, "atrapalhar" o programa do palhaço Batatinha. E vê-los a discutir era um gozo. Mas o melhor era quando o Batatinha achava que já chegava de Companhia, decidia expulsá-lo de uma forma que as crianças adoravam! O diálogo (e movimento) entre eles era, quase ipsis verbis, assim:

Batatinha: Ó Companhia...
Companhia: Hã?
B: Companhia!
C: Hã?
B: Companhia!
C: Hã?
B: (apontando para trás de Companhia) Por acaso está a ver ali aquela portinha?!
C: (virando-se para trás) Haa...aquela?
(Batatinha dá um tremendo pontapé no rabo de Companhia)
C: AAAAAAAAAHHH!



Os nossos amigos Batatinha e Companhia.


Nada mais simples; um palhaço dava um pontapé no rabo de outro e nós divertíamo-nos à grande! Era uma cena repetida várias vezes no Batatoon. E nós gostávamos tanto daquilo que, por vezes, decidíamos jogar esse "jogo". Como crianças que éramos, gostávamos de imitar e de repetir. Então, uma pessoa que quisesse jogar chamava um amigo para se revezarem a ser o Batatinha e o Companhia, a ter a conversa e a dar um pontapé no rabo do outro. É, não era um jogo que desse para jogar sozinho; precisávamos de companhia (perceberam?! Hã? Hã?). Piadas à parte, alguns de nós escolhiam a rede metálica mas flexível que separava a escola da rua para chocar contra. Regra geral, a rede "enxotáva-nos" de volta. E nós ficávamos um bom tempo a fazer de Batatinha e Companhia. Tanto...que a rede metálica acabaria por não aguentar! É, ela já tinha uma falha em baixo (estava dobrada para fora, se bem me lembro) e quanto mais nos atirávamos contra ela, mais ela fraquejava. Naturalmente. Pois a vítima...fui eu! É verdade: quando estava tranquilamente a jogar com um amigo meu, atirei-me contra a rede...fechei os olhos para me divertir mais...senti que estava a avançar demais...deixei de sentir a rede a opor-se ao meu movimento...e quando dei por mim, estava a cair a pequena altura do estrado que, juntamente com a rede, separava a escola da rua. E caí de cabeça.

Pois é...estas brincadeiras inocentes podiam tornar-se perigosas...

domingo, 26 de maio de 2013

Bugs Bunny e o pneu

Como já disse anteriormente, muitas das nossas referências eram televisivas. E o Bugs Bunny não era excepção. Este coelho hilariante servia de inspiração a uma das nossas brincadeiras mais estranhas. Para esta brincadeira, inspirávamo-nos numa espécie de competição que o coelho fazia com um urso do circo. Havia um episódio em que o Bugs Bunny ia trabalhar num circo e entrava em conflito com Bruno, o urso acrobata. Então, eles competiam de mil maneiras. Uma delas era ver qual deles saltava mais alto e para a superfície menos segura. Assim, subiam uma plataforma com uma alavanca e cada um ia cada vez mais alto que o outro. E exibiam-se, do género: "Ai é? Então eu mergulho de 500 metros para cima de uma esponja!". Era dessa competição que nós partíamos.


Aqui está a versão original da cena. Espero que gostem!


Ora, para esta brincadeira, nós precisávamos de duas coisas: um pneu e uma espécie de ladeira. A ladeira da minha escola era muito pequena, mas para nós parecia enorme! O que nós fazíamos era pegar no pneu, pô-lo de pé e prepará-lo para rodar encosta abaixo. Mas antes de o lançar, dizíamos uma coisa como as que Bugs e Bruno diziam. Quando ficávamos sem superfícies para aterrar, inventávamos! Chegámos a dizer que saltávamos de X metros para um cacho de uvas ou para uma casa sem telhado! Além disso, como éramos ainda alunos sem muito conhecimento matemático, não conhecíamos muitos números grandes. Sabíamos até 10000 ou 100000 e pouco mais. Resultado: era possível um jogador dizer: "Eu salto de 12500 metros para um trampolim!" e outro dizer de seguida: "Eu salto de 6000 metros para uma piscina!"! Como se isso fosse um feito maior! É, a nossa noção de escala não se aplicava muito a este jogo. Enfim...quando acabávamos de dizer de onde saltávamos, empurrávamos o pneu ladeira abaixo. Supostamente, o pneu a descer a ladeira representava o nosso salto para a água. Mas o que é uma coisa tem a ver com a outra? Simples: as crianças e o Teatro do Absurdo! ;)

A roda do porco-leopardo

Numa das várias caixas de areia do infantário, por vezes, três ou quatro crianças juntavam-se para andar à roda e cantar uma adaptação de uma das várias canções clássicas da nossa infância. Um pouco de contexto: várias crianças nascidas nos primeiros anos dos anos 90 têm uma memória em comum: as Cantigas da Arca de Noé. Quem se lembra disto deve vir a perceber melhor a brincadeira, mas para quem não conhece...as Cantigas da Arca de Noé eram um conjunto de cantigas baseadas num animal. Havia o Tango do Orangotango, o Morcego Taciturno, O Polvo de Tinta Permanente, O Canguru Pugilista...tudo dentro dessa lógica divertida. Hoje é um tanto difícil encontrar informações sobre este fenómeno. Mas eram uma memória comum a muitas crianças na altura. Quando todos pensávamos que éramos completamente diferentes, era possível que alguém começasse a cantar uma das Cantigas da Arca de Noé e os outros a acompanhassem!


Umas das poucas cantigas da Arca de Noé disponíveis na Internet.
Humorada e elaborada! A nossa não era esta, mas...


Adiante...esta brincadeira apoiava-se numa dessas cantigas. A cantiga tinha um refrão cuja letra era, salvo erro, "Que ninguém chame / Leopoldo ao leopardo / Vamos chamar Leonardo". Engraçado, não é? Pois bem, nós, crianças que éramos, percebíamos mal a letra! Não percebíamos a palavra "Leopoldo" e, vejam bem, pensávamos que a música pedia para não chamarmos ao porco "leopardo"! E era isso que nós cantávamos! Dávamos as mãos, rodávamos e cantávamos: "Que ninguém chame ao porco leopardo!". E não é tudo! Para a brincadeira ficar mais divertida, nós chegávamos à palavra "chame" e recuávamos, puxando os braços uns dos outros com toda a força! Para quê? Para cairmos redondos no chão! E caíamos e ríamos! É verdade; não era uma simples roda com cantiga; era também um jogo de vertigem, como dizia Roger Caillois. E podíamos ficar naquilo durante uma meia hora! Sim, era mais uma das brincadeiras que repetíamos vezes sem conta sem nos aborrecermos! Já se sabe como as crianças gostam da repetição. E assim ficávamos: a fazer a roda, cantado (mal) e puxando os braços uns dos outros para darmos um trambolhão!

A claque do Game Boy

É evidente que, apesar das nossas brincadeiras criativas, um game boy era como um pedaço de carne morta que chamava as hienas todas. E, tal como na vida selvagem, nós atropelávamo-nos uns aos outros para ver quem tirava mais carne! Ou seja...para ver quem conseguia o melhor lugar para ver o "chefe" que tinha em seu poder um Game Boy! Em especial quando era o clássico jogo Pokemon. É verdade que ainda éramos novos demais para perceber o quanto Pokemon podia ser um grande jogo de estratégia que nos desafiava a engendrar esquemas bem pensados para ganhar, mas isso não nos impedia de querer ver o jogo de algum sortudo que tivesse o Pokemon. E era assim: enquanto um jogava, aos outros restava-lhes ver. Além de apoiar e dar sugestões, claro. Éramos como uma claque!


Esta era a flor e nós éramos as abelhas.
Não adoram metáforas?


Aliás...na verdade, não era assim tão simples. Digamos que havia uma certa dinâmica. Quando um rapaz (sim, eram principalmente rapazes) jogava Pokemon, havia praticamente três partes. Primeira: o rapaz que jogava. Segunda: os elementos da "claque" que viam, apoiavam e tinham permissão para jogar um pouco. Terceira: os que viam, apoiavam e NÃO tinham permissão para jogar. É verdade: nos tempos da escola primária já havia esta espécie de classes sociais, ghettos ou como lhe quiserem chamar. Havia um certo número de pessoas que podia jogar e, regra geral, era o dono do Game Boy que decidia quem se podia dar ao luxo de jogar aquele jogo tão fixe. E quem costumava jogar eram os melhores amigos do dono do Game Boy (olha que surpresa!). E estes, por coincidência ou não, eram na sua maioria os rapazes mais rebeldes e mais possessivos do recreio. Modéstia à parte, pessoas calmas e que não diziam asneiras como eu não tinham hipótese. E, de facto, não cheguei a jogar no Game Boy de outra pessoa.

Mas já estou a dispersar...enfim, havia algumas situações curiosas protagonizadas pela claque do Game Boy. A principal era quando se estabelecia o objectivo de capturar um pokemon difícil de capturar. Aí, era frequente o game boy passar por mãos diferentes. É que mesmo os donos do Game Boy achavam uma estopada andar a tentar apanhar um pokemon 10, 20, 30 vezes! E havia sempre a esperança de a técnica de um ser mais eficaz que a do outro. Só que as técnicas de cada um eram uma risota! E grande parte delas era uma imitação mais exagerada da técnica anterior. Quem visse de fora poderia pensar que estávamos malucos: na tentativa de capturar um pokemon difícil de capturar, nós quase batíamos no game boy! Alguns metiam-no debaixo do joelho (para o pokemon ficar preso, presumivelmente); outros, encostavam o Game Boy à cabeça com toda a força; outros ainda o encostavam à cabeça com força e corriam pelo recreio de olhos fechados (sim, corriam com os olhos fechados!). E éramos capazes de ficar naquilo durante uma meia hora! E isto quando era um pokemon normal. Depois havia o misterioso Missingno...


Ah, o doce mistério do Missingno...


Para quem não conhece, "o" Missingno é um famoso mistério dos primeiros jogos Pokemon. Se digo mistério, é porque aquela coisa aparece geralmente com uma imagem desfocada e faz coisas muito estranhas ao Game Boy e à mochila do protagonista do jogo. Há muitas teorias, mais ou menos oficiais, sobre quem ou o quê era o Missingno. De qualquer maneira, o mistério parecia aliciar as crianças, pois muitos portadores de Game Boys queriam apanhar o famoso Missingno! E isto torna-se ainda mais estranho se nos lembrarmos que havia uma lenda da escola que dizia que era muito perigoso apanhar o Missingno! Dizia-se que era um vírus horrível e que quem o apanhasse ficava sem jogo, porque o vírus apagava tudo! Porque quereriam, então, apanhar o Missingno? É que ele nem sequer era uma particular fonte de poder! Mas enfim...eu só assistia, não era minha escolha tentar apanhar aquela coisa...


Curiosos em relação ao Missingno? Têm aqui um
tratado completo feito por um grande fã de Pokémon!


O Missingno fazia coisas muito estranhas, não há dúvida. Lembro-me de o ter visto atacar um Onix de um colega meu com uma pistola de água. Mas ainda não contei a história mais engraçada sobre ele! É que, apesar de ser possível capturar o Missingno, ele aparecia numa zona onde também apareciam outros pokemons. E não vinha de mão beijada; era preciso procurá-lo. Então, nós fazíamos claque para ver procurar o Missingno. Geralmente, o que aparecia era um Clefable ou outros pokemons que não deviam aparecer no mar. Então, nós inventávamos técnicas para o fazer aparecer! Técnicas que não funcionavam e tinham pouca lógica. A mais notória era um (ou mais) rapaz que gritava para o recreio: "Missingno, aparece!". E não estou a brincar; eles gritavam, mesmo! E que mais? Bem, também fazíamos apostas. Apostas sobre o pokemon que ia aparecer a seguir! Às vezes apostávamos todos no Missingno, outras vezes nenhum apostava nele! Nenhuma funcionava! Finalmente, na minha lógica de criança, eu sugeri outro método: sugeri que insultássemos o Missingno para ele ficar danado e aparecer para lutar! E não é que a claque aceitou a sugestão?! Pois é: durante um tempo lá ficámos a insultar o pobre pokemon (?) com crises de identidade. Eu, como não queria dizer asneiras, comecei por lhe chamar "estúpido", mas os rebeldes da claque, com os seus verdes 8 ou 9 anos, começaram logo "Aparece, minha filha da p***!"

Pois é; ghettos, gritos, discussões, asneiras, figuras tristes...muitas histórias divertidas nos deixaram os jogos Pokemon. Mesmo em casa, eu costumava fechar o meu Game Boy Color (recebi-o mais tarde) numa gaveta para o pokemon não fugir!

O gigante do escorrega

Um dos mais absurdos e mais repetitivos jogos da minha infância era este do gigante do escorrega. Todo ele girava à volta do escorrega que havia no infantário onde eu andei, que tinha sido desenhado para se assemelhar a um elefante. E era engraçada a ideia de escorregar por uma tromba abaixo. Mas enfim...embora aquele brinquedo fosse bastante simples, nós complicávamo-lo para efeitos lúdicos. Como? Fingindo que ele era o castelo de um gigante!


O nosso escorrega não era igual a este, mas era parecido...


Ora, este gigante ocupava os seus dias com uma actividade absurda: toda a gente que passasse perto do escorrega - aliás, do castelo! - tinha de responder a uma pergunta do gigante! E o que é que o gigante perguntava? Perguntava se lhe sabíamos dizer 4 partes ou objectos do castelo que fossem gigantescos! A lógica (?) daquilo era: como o gigante vivia rodeado de coisas gigantescas (que incluíam um telhado, uma mesa, pratos e muito mais), nós só tínhamos de dizer 4 coisas que fossem gigantescas no castelo do gigante para podermos safar-nos. Sim, safar-nos; porque o gigante ameaçava pôr-nos na prisão do castelo se não lhe soubéssemos responder! Felizmente, não era difícil responder; só tínhamos de nos lembrar de tudo o que tínhamos na nossa casa e dizer que o gigante também as tinha, só que em tamanho sénior! Como se isto já não fosse hilariante que chegue, mais o era ainda o final da brincadeira!


Eu sou a esfinge, perdão, gigante que propõe 
um enigma a estrangeiros e os castiga!


Quando o viajante, digamos assim, dizia então as 4 coisas que o gigante exigia, o gigante ficava satisfeito e saía-se com esta: "Então, se é assim, tu não vais para a prisão. Vou eu!". E escorregava suavemente para a prisão, onde ficava! Que idiossincrasia tão gira! E quão absurdo aquilo era! Quer dizer, um cruel gigante que ameaçava viajantes inocentes, no caso de eles responderem bem, resolvia colocar-se na sua própria prisão, como se fosse obrigado a isso por causa de uma resposta bem dada? Haverá algum vilão mais tolo que este?! E nos revezámo-nos para fazer o papel deste "gigantolo". Havia quem jogasse a pares e cada um fazia um papel de cada vez.

Sobre esta brincadeira, há que sublinhar ainda como é incrível nós termos quase previsto uma parte da história do Rei Édipo, sendo que nenhum de nós tinha alguma vez ouvido falar de Édipo!

O que todos deviam ler antes de ler este blog

Esta mensagem, espero, estará em breve resumida no meu perfil, mas de qualquer modo...

Desde já dou-vos as boas-vindas a este blog! É um projecto modesto vindo, entre outras coisas, do meu gosto em recordar e contar histórias sobre as brincadeiras que eu fazia e via fazer quando era criança. Ah, e também pretendo explorar um pouco os sonhos de criança (eu tinha com cada sonho maluco...é uma diversão lembrar!) Eu rio-me muito e faço rir bastante quando conto estas histórias. E o meu desejo de as contar a mais pessoas levou-me a fazer este blog. Espero que apreciem.

Estranharam o título do blog? A ver se eu me explico...tenho uma ligação ao mundo do teatro que me permite dizer que o Teatro do Absurdo é uma realidade. Ou seja...muito rapidamente, "Teatro do Absurdo" é o nome dado a todo um conjunto de textos teatrais escritos principalmente no século XX. Suponho que já têm uma ideia sobre o que caracteriza este tipo de teatro: situações absurdas - pois então! - e completamente imprevisíveis, acontecimentos de uma lógica incompreensível aos nossos olhos! Também não quer dizer que vale tudo; até à data, não li nenhuma peça do Teatro do Absurdo em que aparecesse um monstro gigante em cena de um momento para o outro. Nem que as personagens sejam formigas a dançar o samba enquanto fazem crochet com os pés. Não; as peças são mais sóbrias que isso. Mas algumas delas não deixam de ser uma risota! Parto-me a rir quando leio algumas! Estão interessados? Então procurem peças de autores como Eugène Ionesco (o meu favorito!), Samuel Beckett, Arthur Adamov e Jean Genet. Se tiverem mais sede mas o pote estiver vazio, podem experimentar outros que não são os melhores exemplos no que toca ao Teatro do Absurdo mas que ainda têm ligações com este (Fernando Arrabal, Harold Pinter...)

Portanto, o que vou contar são aqui algumas das minhas experiências - e dos meus amigos de infância - nas brincadeiras divertidas e de uma lógica difìcil de compreender agora que crescemos. Escusado será dizer que este blog vai ter pouco de útil para quem quer que seja. Que fique bem claro que a minha intenção é divertir os leitores e divertir-me. Espero sinceramente que os leitores deste blog estejam receptivos a estas histórias de infância para trazer momentos divertidos à sua vida. Não estou aqui para estragar a vida a ninguém. Claro que, se o blog puder valer-vos em algo que não seja só a diversão, melhor ainda! Mas, até ver, o principal objectivo dos posts deste blog é divertir. Mais uma vez, espero que gostem.

Queria ainda agradecer à minha professora Marlene Peres, que me ajudou muito a fazer este blog.

Um bom dia para todos!